Relatos

Nas edições de 2016, 2017 e 2018 foi feito um APELO á apresentação de textos em forma de poemas, relatos ou reflexões sobre a violência contra as mulheres, os quais foram recolhidos nesta secção

18 de novembro de 2016


Ontem a minha melhor amiga fez anos. Foi uma festa maravilhosa, todos se divertiram. Quase ninguém faltou. A festa começou no início da tarde, depois do almoço, com a ida da aniversariante às compras com as suas amigas mais próximas. Depois realizou-se um jantar fenomenal, no qual foi possível rever rostos de amigos de longa data e de, naturalmente, conversar sobre assuntos insignificantes, típicos da gente da nossa idade.

Até o Fred esteve lá!

O Fred foi, durante todo o tempo de escola, na primária, o meu namorado. Embora fossemos crianças, eu simpatizava bastante com o miúdo. Junto dele sentia-me segura. Ainda me recordo da forma como ele me defendia dos miúdos mais velhos e rebeldes de lá da escola. O que me fazia sentir apaixonada.

Infelizmente, não pude abraçar a minha melhor amiga, nem rever o Fred. Não tive coragem de lhe contar ao João que a minha amiga fazia anos e que iria passar algumas horas divertindo-me sem ele. Achei que a melhor forma de evitar problemas na nossa relação fosse não lhe contar.

Não sei explicar, mas o meu namorado não tolera os meus amigos, sobretudo, os rapazes. Sempre que algum rapaz passa por nós na rua e me acena, porque me conhece ou porque somos da mesma turma ou porque simplesmente já conversámos algumas vezes, o João deixa de falar comigo. Acusa-me de ter "amiguinhos". Pensa que só namoro com ele por disfarce e que faço dele um tolo.

No outro dia, forçou-me a dar-lhe a minha senha do computador, do Facebook e do telemóvel. Durante uma hora, procurou, incessantemente, contra a minha vontade, por provas que me denunciassem como "traidora". Quando o meu telemóvel toca, apenas atendo a chamada ou leio a mensagem, após o seu consentimento.

Já não tenho conta no Facebook, a lista de contactos do meu telemóvel resume-se, somente, aos meus familiares e ao João, pelo que passei a dizer aos meus amigos que já não ligo às tecnologias e que seria muito mais feliz sem elas. Fiz de tudo para evitar que eles me contactassem, mas continuam a insistir, o que me leva a ter o telemóvel sem som para o João não o ouvir.

Hoje tenho poucos amigos. Muitos deixaram de me falar, passam por mim e fazem que não me conhecem, mesmo quando vou sozinha. A Ana continua a ser minha amiga, mas, por muito, que lhe queira confidenciar a forma como o João me trata, não consigo, não tenho coragem de o desafiar.

Eu amo o João. Ele tem a sua maneira de ser e eu, como sua namorada, tenho que lidar com ela. Quando ele me pergunta o motivo de não ter saído com a Ana, respondo-lhe que não me apeteceu e que não gosto dessas coisas ou que a acho uma chata. Uma vez ele ameaçou-me que me deixava e eu não quero que isso aconteça.

Acabo de sentir a porta do hall da entrada a abrir, o meu namorado chegou. Infelizmente não poderei desabafar mais hoje, talvez, numa próxima, quando o João voltar a sair....

Até breve. 


João Pedro Baptista

2016

Era uma vez...


Começo por "era uma vez" propositadamente. São assim que se iniciam as histórias que, em crianças, aprendemos. Começam por "era uma vez" e prosseguem com a linda história de uma princesa qualquer, que se apaixona por um príncipe qualquer, e que o mesmo a trata bem. Finaliza-se sempre com um "e foram felizes para sempre".

Somos mulheres e, por isso, em crianças, são estas as histórias que nos contam. Aprendemos que temos que nos arranjar, sair bem vestidas, casar e ter filhos. Aprendemos que o casamento deve ser para sempre, que é feio separarmo-nos do homem com quem nos casamos, que o amor só existe entre pessoas do sexo oposto. Somos mulheres e, então, nascemos para tratar da casa, dos filhos e do marido. Se pensarmos bem, nós, mulheres, não temos sequer o direito de nos ocuparmos connosco. Nascemos para os outros e não temos tempo para nós.

Somos, desde que nascemos, alvo de pressão social. Pressionam-nos quando nos quase "obrigam" a brincar só com bonecas e quando nos criticam se jogarmos à bola. Começa na nossa educação a problemática da violência.

Nós, mulheres, parece que nascemos para ser princesas. Somos estigmatizadas quando arranjamos um trabalho, quando não temos o cabelo comprido, quando não somos magras como deveríamos, quando não nos maquilhamos, quando não nos arranjamos como gostariam que nos arranjássemos para sair. Nós, mulheres, somos alvo de criticas e piropos quando passamos em frente a determinados homens, que pensam que têm o direito de opinar quanto ao nosso corpo, à nossa roupa e ao que quer que seja que nos diga respeito.

Se somos violadas, somos acusadas de nos termos posto a jeito. Se somos vítimas, de alguma forma, dos homens com quem mantemos uma relação, foi porque lhes aprontamos alguma. Mas, ao fim ao cabo, somos nós, mulheres, que somos as vítimas às mãos dos homens. Pior do que isso, somos vítimas dos homens com quem nos deitamos, com quem vivemos e pelos quais mantemos, muitas das vezes, uma relação de afeto.

Se nascemos para ser princesas, como tantas vezes nos contaram, por que razão não nos contaram a história toda? Se ser princesa é isto, ser maltratada, por ser o sexo mais fraco, então nós não queremos ser princesas. Somos mulheres! Mulheres que merecem ser respeitadas, em vez de maltratadas. Nas histórias de quando éramos crianças, ninguém nos contou que, por sermos as tais princesas, teríamos que nos sujeitar a este mundo de violência. A violência para com as mulheres é constante e começa bem mais cedo do que imaginamos, por isso, é preciso relembrar que há muito a ser alterado na educação das crianças. Os rapazes não têm que brincar com armas; as raparigas não têm que brincar com bonecas, pois é graças a isso que, tantas e tantas vezes, nos deixamos ser brinquedos às mãos dos homens, os quais nos matam com as armas que, em pequenos, aprenderam a manusear.

Queremos somente que nos respeitem e não nos maltratem. Sejam homens, não sejam covardes e deixem-nos ser mulheres! Não queremos ser donas de casa, queremos ser também donas da casa!


Ana Beatriz Moreira Pinto

3ºano da Licenciatura em Serviço Social

2017




Arma escondida, cobardia disfarçada


Boa Tarde,

Chamo-me Fabiana, tenho 33 anos e sou natural de Santarém.

Aos 21 anos, conheci o Filipe. Era lindo! Tinha olhos verdes, era alto, charmoso e um verdadeiro cavalheiro. Nessa altura, estudava Direito, em Lisboa. Aos fins de semana, quando vinha à terra, levava-me a jantar fora. Delicadamente puxava a cadeira para eu me sentar. Pedia o melhor vinho para brindarmos ao nosso amor. Olhava-me apaixonadamente. No fim, pedia a conta e pagava. Levava-me a casa. Quando lá me deixava, deixava comigo a promessa de casarmos um dia.

Quando acabou o curso, o pedido surgiu. Aceitei!

Foi então que marcamos o casamento. Dia 24 de julho de 2008. Deixou nas minhas mãos todas as decisões do casamento. Ele trabalhava, não tinha tempo. Somente organizou a sua despedida de solteiro.

Organizei a minha despedida de solteira, queria partilhar a minha felicidade com as minhas amigas. Surgiu assim a primeira discussão, três semanas antes do casamento. Disse que não fazia sentido nenhum, que podia despedir-me dos meus tempos de solteira com ele. Eu cedi... Ele estava cansado do trabalho, não quis alimentar a discussão.

E CASAMOS! Depois de ele ter tido a sua despedida de solteiro com os amigos. E eu nada... Mas estava feliz. Tão feliz! Jurou amar-me e respeitar-me a minha vida toda. E eu acreditei, plenamente...

Fomos de lua de mel para Moçambique. Correu tudo bem, até ao dia em que um homem num bar começou a olhar para mim sem qualquer descrição. Fomos para o hotel. Pelo caminho, insultou-me. Disse que devia vestir-me mais discretamente.

Quando chegamos ao hotel e ele bateu a porta da nossa suite, estremeci. Foi então, em Moçambique, na lua de mel que combinamos ser perfeita, que levei a primeira bofetada.

Voltamos de lua de mel e, nesse mesmo dia, comprou-me um ramo de rosas. Pediu desculpa pelo que se passou na lua de mel e jurou nunca mais voltar a agredir-me. E eu acreditei, plenamente...

Este ciclo várias vezes se repetiu. Por tudo e por nada, levava uma bofetada. Ele pedia desculpa... E eu durante algum tempo acreditei, plenamente...

Com o passar do tempo comecei a temê-lo...tinha nojo...tinha medo...

Pensei no divórcio, várias vezes, mas recuava sempre nos passos. Até ao dia em que vi á minha frente um monstro. Chegou a casa, bêbedo, e pediu o jantar. Sentou-se à mesa e gritou por mim. Eu fui lá, com as pernas a tremer, e em voz baixa disse-lhe que pensei que tivesse ido jantar fora. Mas não foi... E eu não tinha o jantar pronto para ele... E ele bateu-me, bateu-me tanto! Eu consegui fugir, e fui, pelos meus próprios pés ao hospital. Foi então que pedi o divórcio.

O homem lindo com quem casei tranformou-se num autêntico monstro. Bateu-me, insultou-me e deixou-me num caco. O homem que jurou amar-me e respeitar-me, o advogado mais respeitado em Santarém, foi o mesmo homem que me levou ao fundo do poço.

O divórcio, litigioso, veio piorar toda a situação. Persegui-me até ontem. Ontem foi o fim. Senti uma bala perfurar-me o peito. Em plena rua. Ele matou-me.

Mas estou aqui hoje para contar a minha história. Para que se faça alguma coisa por estas mulheres, para que se tomem medidas, para que sejam denunciadas todas estas situações, para que todos os vizinhos que saibam, percebam que entre marido e mulher mete-se, sim, a colher. Este é um dever de todos e de cada um de nós aqui presentes.

Cabe-nos denunciar aqueles que fazem das suas mãos uma arma!

 Ana Santos & Beatriz Moreira Pinto

Alunas do 4ºano da Licenciatura de Serviço Social 

2017

Violência na intimidade


Toda a nossa vida e pautada de um sentimento fundamental, o amor. Todos nós, principalmente as mulheres idealizam o amor com o homem perfeito, com o casamento perfeito. Enfim o início de uma bela história que de um momento para o outro pode ter fim com uma agressão física ou verbal pela pessoa amada. Mas este sentimento de amor apodera-se de nós, coloca-nos em segundo plano e nós perdoamos. O dia até correu mal, ele até estava cansado e sem querer descarregou em nós. Mas o tempo vai passando e a relação não volta à paixão do início onde tudo é belo e para sempre. A rotina vai-se instalando e com a azáfama do dia-a-dia esquecemo-nos de pensar em nós para pensar nos outros. Será que é mesmo isto que queremos para a nossa vida? Por vezes esquecemo-nos de dar espaço ao outro para cultivar as suas relações de amizade e não se centrar apenas em nós criando uma relação de dependência que mais cedo ou mais tarde se podem tornar doentias ao ponto de despertar novamente a violência e desta vez pode mesmo chegar a ser física. O dia até correu mal, ele até estava cansado e sem querer descarregou em nós. O amor, esse sentimento nobre e que nos transforma cada vez que olhamos e estamos com a pessoa amada é capaz de deixar marcas profundas no nosso ser quando esse amor não respeita as fronteiras do nosso ser. Quando a outra parte acha que a sua opinião é mais válida do que a nossa, só por ser de um sexo que a sociedade definiu como forte. Onde a demonstração dessa força é feita com violência que por sua vez é uma antítese do amor.

Amor e violência não se conjugam em vida nenhuma e quando estão presentes no mesmo espaço o resultado é desastroso. As marcas deixadas por esta conjugação perduram no tempo e os anos apenas fazem com que consigamos falar delas com mais serenidade, mas dói, dói muito saber que alguém para ser feliz precisa de nos faltar ao respeito e de passar "por cima" de nós. Amar é deixar transparecer a nossa essência através das atitudes para com o outro. Porque "Amar não é olhar um para o outro, é olhar juntos na mesma direção" (Antoine de Saint-Exupéry). 


Sandra Ferreira

Serviço Social 3º ano 

2016

Inquieta-te com a violência na intimidade


Estava em casa. E, naquele dia, tinha a intensão de por fim a tudo. À tua presença excessiva na minha vida e à prisão em que se tinha transformado a nossa relação. Parecia que a cada vez que eu saia tu tinhas de saber. Mas eu já não o suportava.

Chegas-te. Fui abrir a porta, mas não te deixei entrar. E a medo disse que o que havia entre nós não podia ir mais longe.

O porquê? Porque em pouco tempo conseguias abafar a minha existência de tal forma que nem me deixavas dar um passo.

Disse que já não queria viver nesta situação, que não ia fazer mais nada para nos manter juntos.

Nesse momento, a tua mão levantou-se. Fechaste o punho com força, acho que foi com a mesma força com que o meu coração apertou e que o meu maxilar se contraiu. Mas o golpe não caiu, não me tocaste. A tua mão voltou a baixar-se, mas o que eu via já não era o mesmo. 

A minha mente fluía a mil à hora, pensei no que teria feito se me tivesses ferido, no que me podia ter acontecido. E aí, como uma revelação, pensei no que podia acontecer no futuro.

Tu levantas-te a mão num gesto agressivo. Não, não me bateste. Mas o gesto em si mostrou-me aquilo que tu eras. Nestes momentos, não é preciso chegar ao ponto de nos violentar para provocar um clique na nossa mente. O simples facto de levantar a mão basta, porque para que essa mão se levante é necessária uma intenção. E por mais que o golpe não se abata sobre nós esse alguém teve a intenção de o fazer. E se hoje apenas foi um gesto que não chegou ao seu fim, amanhã pode ser uma marca na nossa cara.

Foi então que a minha mente se tornou mais clara, eu não podia ficar com alguém que tivesse a intenção de me magoar. E foi por isso que mantive a minha posição e não abdiquei até ires embora.

A lição que ficou? Foi apenas a seguinte: basta um gesto.


Cláudia Richard

2017

"Inquieta-te com a violência na intimidade "


A violência é atualmente uma temática que preocupa a sociedade em geral.

Do ponto de vista social, esta é fonte de inferiorização e desencadeia predominantemente o desrespeito à intimidade do outro, ou seja, compromete o desenvolvimento da pessoa, neste caso a mulher, em relação ao meio que a rodeia. A Violência é de carater complexo e multidimensional. Desde sempre se ouviu e reportou situações de violência, mas também é verdade que esta problemática ainda não atingiu o seu término.

Esta abarca dinâmicas amplas, podendo envolver o uso intencional da força e/ou intimidação contra outrem, coagindo-a na sua ação causando-lhe danos físicos, bem como agressões não físicas, violência emocional ou psicológica. A violência afeta a intimidade do ser agredido numa visão holística, ou seja, desde o psicológico até ao isolamento social e por vezes enuncia e potencia mesmo o ato da morte/suicídio.

A intimidade, como a própria palavra enuncia é algo intimo, algo que diz respeito à pessoa enquanto ser singular definido pela sua identidade, valores e personalidade.

Estas mulheres não conseguem apagar da sua memória o ato de bater, pontapear, arremessar objetos, desvalorizar, restringir contatos com familiares/amigos, práticas sexuais contra a sua vontade e até mesmo coagir a mulher a manter relações sexuais com terceiros. Estas passagens deixam marcas na vida da pessoa, que por mais que branca que seja a borracha não consegue apagar as marcas gravadas na alma da Mulher.

Perante um relato de uma vítima, em que esta desabafa que foi vítima de violência é da competência de qualquer individuo agir sobre o sucedido, caso não o faça está a potenciar a repetição de atos e inferiorização da integridade humana.

Raramente é um ato único, sendo por vezes um processo continuo no tempo e nas relações de intimidade ou até mesmo após o termo dessas. Por isso, nunca se pode simplificar o termo violência, pois esta significa crime, e este é um crime público pelo qual o agressor tem que ser punido.

Como ser ativos na sociedade devemos lutar pelo direito da integridade pessoal e social, ou seja, todo o ser humano deve promover a anulação do ato de magoar, violar a integridade do outro, não podemos deixar passar ao lado nem muito menos fazer de conta que não vimos, não ouvimos e não sabemos. Tal como diz o ditado "As dificuldades são como as montanhas. Elas só se aplainam quando avançamos sobre elas." Provérbio japonês


Daniela Filipa Boal G. A. dos Santos

Serviço Social 

2016


Porque é que me bates

quando dizes que me amas?

Porque é que me prometeste

amor quando só te zangas?

Achas que isso são maneiras

de tratar a tua mulher?

Achas que estas a agir de formas

corretas quando me devias proteger

Fico impotente quando me bates

Estou farta de me sentir humilhada

Gostava que me respeitasses

Gostava de me sentir amada

Quando te casaste prometeste-me

que me ias sempre amar

E agora so sabes desprezar-me

E so me sabes humilhar

Basta de violência

Basta de desgosto

Viva a clemência

Viva o amor posto

As mulheres devem ser sempre amadas e respeitadas!


Joana Martins

Aluna do 3º ano do Serviço Social

2017

Inquieta-te com a violência na intimidade


Estava em casa. E, naquele dia, tinha a intensão de por fim a tudo. À tua presença excessiva na minha vida e à prisão em que se tinha transformado a nossa relação. Parecia que a cada vez que eu saia tu tinhas de saber. Mas eu já não o suportava.

Chegas-te. Fui abrir a porta, mas não te deixei entrar. E a medo disse que o que havia entre nós não podia ir mais longe.

O porquê? Porque em pouco tempo conseguias abafar a minha existência de tal forma que nem me deixavas dar um passo.

Disse que já não queria viver nesta situação, que não ia fazer mais nada para nos manter juntos.

Nesse momento, a tua mão levantou-se. Fechaste o punho com força, acho que foi com a mesma força com que o meu coração apertou e que o meu maxilar se contraiu. Mas o golpe não caiu, não me tocaste. A tua mão voltou a baixar-se, mas o que eu via já não era o mesmo.

A minha mente fluía a mil à hora, pensei no que teria feito se me tivesses ferido, no que me podia ter acontecido. E aí, como uma revelação, pensei no que podia acontecer no futuro.

Tu levantas-te a mão num gesto agressivo. Não, não me bateste. Mas o gesto em si mostrou-me aquilo que tu eras. Nestes momentos, não é preciso chegar ao ponto de nos violentar para provocar um clique na nossa mente. O simples facto de levantar a mão basta, porque para que essa mão se levante é necessária uma intenção. E por mais que o golpe não se abata sobre nós esse alguém teve a intenção de o fazer. E se hoje apenas foi um gesto que não chegou ao seu fim, amanhã pode ser uma marca na nossa cara.

Foi então que a minha mente se tornou mais clara, eu não podia ficar com alguém que tivesse a intenção de me magoar. E foi por isso que mantive a minha posição e não abdiquei até ires embora.

A lição que ficou? Foi apenas a seguinte: basta um gesto.


Anónimo

2017

Testemunho perdido


Olho-me no espelho, não me reconheço,

Acaricio o meu rosto, não o encontro,

Grito bem alto, não me oiço.

Na minha sombra, grita, grita alto,

Vidros, sangue, vidros, sangue.

Olho-me no espelho, não o conheço,

Fito-o, fragmentado e triste

Espelha-me como nunca me espelhou.

Não mais, não mais. Por favor para!

Palavras confundíveis pelo quebrar

Da loiça, dos candeeiros, da televisão.


João Pedro Baptista

2016

Desculpando-Me!


Eu, uma rapariga jovem cheia de sonhos e objetivos, e que mais uma vez apanhei um avião para uma outra terra distante, porém não mais para fazer uma viagem de férias, mas sim para realizar e concretizar um objetivo profissional e acadêmico - o meu curso.

Chego no Reino maravilhoso, mas nem todos no reino são maravilhosos (podem ser encantadores!), nem mesmo o que se parece com personagem de livros de romance ou um amante de poesias...Literatura. Mas, eu não percebi e me encantei com ele...

Sim! Eu me apaixonei. Me encantei... Aos poucos ele foi me conquistando, pela insistência, com os poemas escritos, e-mails...Enfim...quando percebi, eu estava vivendo um romance de livros, quase iguais aos que eu lia todas as noites antes de dormir na minha terra...

O "príncipe dos livros" foi me conquistando cada vez mais, porém ao mesmo tempo, me limitando, sufocando e me isolando cada vez mais também, mas eu não percebia.

Meu tempo começou a ficar cada vez mais condicionado a ele e aos seus compromissos de trabalho, o meu curso eu já não tinha mais tempo e nem concentração para me dedicar e estudar. Era tanto amor da parte dele que nem eu acreditava... E para este amor não faltavam testemunhas...Ele fazia questão disso..que houvessem testemunhas..por isso me beija sempre e sempre e muito e sempre dizia: "Eu Te amo Muitíssimo na frente de todos! E eu acreditei em cada palavra e gesto dele...Acreditei que ele pudesse ser o meu companheiro de jornada... E me entreguei de corpo, alma e coração, mas acima de tudo com toda a honestidade e sinceridade.

Ele me manipulava o tempo todo, mas eu não percebia.

Nessa fase eu já fazia tudo o que ele queria... Ele me convenceu a me mudar para casa dele...O ajudava no trabalho dele... Meus fins de semana eram dele...Ajudava nas despesas.. Viajava para onde ele queria ir...Quando eu não estava em aula eu estava dentro de casa ou com ele.. Ele me ligava a todo momento, caso eu estivesse a rua. Pela manhã antes dele sair para o trabalho me perguntava o que eu ia fazer durante o dia e eu respondia.... Já a noite, voltava a me perguntar, e caso, a minha resposta fosse diferente da qual dei pela manhã... Ele já reclamava... e me olhava estranho. Ele começou controlar os meus tempos e dias de aula. Começou demonstrar ciúmes de meus amigos daqui e da minha terra... Não gostava dos meus amigos daqui... Controlava as minhas conversas com amigos da minha terra... Dizia que as pessoas na cidade iam começar a falar de mim... Enfim... Eu aceitei tudo e para não contrariá-lo, não ia mais tomar café com meus amigos, conversar ou estudar com eles, conversava pouco pela internet com meus amigos. Comecei a me isolar. Ele me controlava e eu não percebia. E nessa fase ele sempre me dizia: "Eu te amo muitíssimo"! E eu acreditava!

Um dia recebi uma ligação para começar a trabalhar.... E as coisas começaram a mudar.... Quando dei a notícia a ele que ia começar a trabalhar, ele respondeu durante o jantar: "Isso vai afastar a gente!" Fiquei sem ação e sem entender (Até hoje!).

Bom, as coisas mudaram mesmo... Ele começou a ser frio comigo...Dizia que ia ficar lendo no outro quarto...As discussões começaram.... Começou a falar mal do meu trabalho...Começou a falar para mim que eu ia para o trabalho para ficar de conversas com meus amiguinhos....dizia que eu me arrumava para meus amiguinhos... Começou a dizer que eu não prestava... Não servia para nada.... Dizia que eu não tinha cabeça... Começou a me xingar.... Começou a inventar motivos pra brigas... Enfim, aquelas palavras que ele dizia me levavam ao chão... Comecei a perder o entusiasmo pelas coisas, a vaidade, o amor-próprio... reprovei nas disciplinas.... porque não estudava mais...estava muito triste com tudo aquilo. Não queria saber mais de nada. Eu só queria resgatar o meu relacionamento.

Durante as nossas discussões ele sempre dizia: A culpa é sua! Um dia, desconfiada de certas coisas, fiz uma pesquisa e descobri que ele ainda trocava mensagens de amor com algumas mulheres que ele se relacionou durante o tempo em que morou na África. Descobri também depois, que ele enviava mensagens de amor e de carinho em excesso para uma amiga da Espanha. E, por essa descoberta eu recebi o primeiro soco na cara e empurrão que me fez parar no outro lado da casa.. Lembro que nesse dia uma amiga dele, que foi até a casa, disse ao me ver marcada: "Ele não é assim...." Ou seja, entendi que a culpa foi minha. E eu acreditei na culpa...que nunca foi minha..mas acreditei que era minha culpa. Mas, ao mesmo tempo pensava: Eu nunca fiz nada de errado...Vivia pra ele, ele que me traiu... que mentiu para mim... que errou e me acusou das coisas que ele fez... Não eu!

Mas, mesmo assim, o perdoei pela agressão, não consegui sair do lado dele...Não tinha forças para sair... queria resgatar o "nosso amor", consertar as coisas, pois na minha cabeça " A culpa era minha".

As discussões, as acusações, humilhações,deboches dele continuavam... Sempre dizia: A culpa é sua! E eu sempre acreditava que a culpa era minha e já estava a adoecer e enlouquecer dentro daquela casa fria e sozinha... Já não comia e nem dormia direito... E ele já ia pra casa quando o apetecia...mas eu sempre estava em casa a espera dele... Porém, todas as vezes em que ele voltava para casa, ele sempre arruma um jeito de me provocar, acabávamos discutindo e mais uma vez ele me batia. Foram quatro vezes em que levei socos na cara, que tive meu corpo arranhado com marcas, que fui empurrada fortemente, entre outras coisas.... Dentre todas, a ultima vez, foi a pior que aconteceu, que foi na outra casa dele, que fica distante da cidade... Onde fui questionar mais uma vez o comportamento e atitudes dele... E ele me encostou contra a parede, apertou o meu pescoço, deu mais socos em minha cara, que cai meio desmaiada no chão da casa de banho... Não o suficiente ele foi até lá e me arrastou pela casa e me jogou no chão da sala... Fiquei lá no chão um bom tempo... acordada e consciente, mas não queria levantar, porque eu já não tinha mais dignidade e nem mais forças para sair do chão. Naquela noite foi a ultima vez que ele me bateu! No dia seguinte ainda muito machucada e humilhada, consegui voltar para a cidade e sair da casa dele.

Eu sobrevivi a ele, e todos os transtornos, traumas que ele me causou. Hoje carrego culpas por decisões que tive que tomar para não ter nenhum tipo de ligação com ele e para acima de tudo não sofrer mais .

Infelizmente, não o denunciei, cheguei ir a delegacia, ainda toda marcada, mas não tive coragem por amor a minha vida. Porque, quem vê a cara dele..não vê o coração e o caráter ruim que ele tem...Eu sei quem ele é de verdade. Eu na época já estava muito machucada, cheia de traumas, conseqüências, feridas, dores e perdas por causa dele.. Não queria ter mais um capítulo neste triste livro com ele. Optei pelo meu bem-estar e recuperação psicológica, e isso, implicou em não registrar queixa, não queria mais contato.

Mas, isso não me impede de falar e alertar as outras mulheres contando aqui muito resumidamente a minha triste história com esse senhor. A gente nunca acredita, mas pode acontecer com todas nós, e há muitos desses homens... E muitas vezes muito bem disfarçados, dedicados com comportamentos e bondades, que os deixam acima de qualquer suspeita, infelizmente.

Meus pais nunca me bateram.... E no lugar mais calmo, seguro, tranqüilo que conheci, foi onde encontrei a pessoa mais selvagem! É muito difícil para mim estar escrevendo essa história, porque para escrevê-la, tenho que relembrar tudo o que passei e vivi ao lado desse senhor. E eu não gosto de lembrar dele!

Dói muito, hoje vejo como fui burra, idiota, ingênua... Por que não reagi na primeira vez? Por que permiti até a quarta vez? Quando penso que eu podia ter morrido fico tensa.

Sobre ele: Não costume prestar muito atenção...Mas de vez em quando, ainda o vejo, todo prosa,cínico, sem culpa ou arrependimento e vendendo e contado mentiras na cidade....Com muitos seguidores e amigos, mesmo porque ele ajuda muita gente e isso faz com que ele tenha uma imagem muito boa perante a sociedade. Alguns até sabem ou desconfiam quem ele é de verdade, e o que ele fez, mas preferem ou preferiram fechar os olhos, ignorar a minha dor o meu grito, porque é bom ter ele como amigo, é uma pessoa bem influente e relacionada na cidade e até em países...

Quanto a mim, vivo a minha vida e agradeço a Deus todos os dias por ela e aos meus amigos, por tudo que fizeram por mim.

E tenho sempre na mente hoje esse ditado popular: "Quem vê cara, não vê coração" E isso se aplica perfeitamente a ele.


Assinado: Além do Atlântico.

A Mulher que Gritou Amor ao Coração do Mundo


   Estás acordado? Deixa-me dar-te a novidade. Estrangulada num sarilho, esmagada na gravidade. Pisada por uma culpa que visto, não assumiste ou fundiste uma luz.

Desisto do risco.

Era um aviso, puseste o pé à confiança e testemunhei a perdição nessa miscelânea de causas. No desdém de uma felicidade nata feita em cinzas ainda vindas de uma força tão queimada.

Brindaste comigo os azares eramos ambos ímpares. Os corpos pingavam ponteiros, sobre minutos preliminares.

Dormia nua num quarto onde era símbolo da morte, pois os gemidos eram pianos que calavam a tua fome. Ou cortes em que caí fraca num parto de uma astúcia.

Casaste-me com remorsos para teres gozo de outras núpcias só para as noites lançarem punhos às minhas lamúrias!

Fugia da minha silhueta pr'as Astúrias, onde exibia a carne, as rugas e as varizes. Até sempre eu dona dessas matrizes, das pernas e das putas das cicatrizes.

Um dia houve, que foste válvula embriagada, partiste na falácia e atropelaste uma esperança, num cruzamento em que a raiva era a aliança.

Da insensatez talhada, do espelho cru e flagelado, ergo-o agora intacto.

Os pedaços são eu! O chão que pisas sou eu!

Esta chuva de estranheza ainda rodeia o céu das nossas crias. O mar apodera-se do vazio desta vida. O que tenho nas mãos é meu e teu!

Mas no pesar disso tudo, há um apesar disso. E tu, pertences à tua essência.

Uma justiça a meio termo: plantada lei, premissa na flor dos nervos.

Deixo-te o excesso a uma ida sem regresso. Sou o interlúdio que escolheste entre gritos e silêncios.

Suei o teu corpo absorto, estou no dedo desse gatilho. Outrora, barrei-te a consciência com o sangue dos teus filhos.

Hoje choram imagens adulteradas e o leito das palavras.

Não há sentidos neste reino mau e toda a gente já sabia.

Haverá alguém que explica? O único arco-íris que miram tem sete linhas brancas. Porque achas?

Ainda assim, sou testemunha ausente. Pus uma cunha há tempos, na solidão para estar à vontade com os meus lamentos.

Aqui explico o teu intuito, estou no trauma que não sara. E boba fui eu por não fazer o que outros sabem.

Tenho a poeira, a chaga soletrada - que cegou a tua visão de pai.

Já não há ligas que cubram a mágoa que em mim pisou.

Fui paixão à primeira vítima, e dancei vezes demais no carrossel deste karma.

Garanto-te que és selvagem e o meu pranto é teu espanto.

A ponderância não apareceu, fui eu que a escondi.

É demasiado, o tormento sabe-me a ti.


Henrique Manuel Lopes Correia Guimarães

3º ano, Serviço Social

2017

Que amor não me engana

Mergulhados na profunda certeza de que o amor não é um lugar estranho, é-nos clara a ideia de que conhecemos devidamente quem temos ao nosso lado, independentemente da idade, do sexo, das crenças. Vivemos a acreditar que estamos conscientes dos prazeres e da alegoria das vivências que procuramos no amor, mais ou menos eternos, tanto que se tornam raros os momentos em que questionamos o outro lado, que nos é difícil acreditar que essa pessoa, de quem tanto se gosta, seja - alguma vez - capaz de nos magoar.

Afinal, aquilo que se procura numa relação é a partilha de uma intimidade que não se tem com mais alguém, de uma confiança profunda - alguém com quem nos podemos verdadeiramente partilhar.

Estava sentada na cama, com o olhar insistentemente vidrado no telemóvel, à espera de qualquer confirmação de que não estava sozinha. Era quando se sentia só que mais pensava em tudo o que de errado se passava, revivia todas as situações, as atitudes que poderia ter tido e as palavras que lhe deviam ter saído nos momentos certos, não fosse aquele terrível nó na garganta que não deixava nenhuma palavra passar.

A primeira vez que ele criticou a maneira como se vestia, soou tudo a ciúme miudinho sem importância, uma espécie de confirmação de tudo o que sentia. Ela sorriu, disse para não se preocupar: já que isso o incomodava, iria ter mais cuidado. Quando repetiu a mesma observação, de forma rude e violenta, na frente dos amigos, não conseguiu reagir: a sua face corou, o nó na garganta cresceu de tal forma que as palavras ficaram encurraladas e os olhos, esses observadores daquela cena tão repetitiva, inundaram-se de lágrimas. Não disse nada. Resvalou-se na vergonha e não falou com ninguém.

As críticas tornaram-se mais constantes, incessantes, repetidas: parecia que nada era suficiente. Vieram as discussões e libertaram-se os insultos: a ansiedade crescia sempre que fazia alguma coisa sem lhe dizer, ficava nervosa e a disposição entrava numa galopada decadente. Quando se lembrava dele, nesses momentos, a ansiedade atacava-a de tal forma que se tornava num calafrio que lhe percorria o corpo, um enjoo incontrolável e, como que de repente, sentia-se inundada por um profundo sentimento de culpa. Foi assim que deixou de combinar sair com os amigos - estar com ele tinha de ser suficiente, esses eram os únicos momentos em que não se sentia apreensiva, não teria de lhe esconder o que ia fazer e consequentemente, não precisava de ter medo da reação que a esperava se ele descobrisse que tinha saído sem lhe dizer.

Estava sentada na cama, sentia-se sozinha, isolada do mundo. E perguntava-se quantas vezes deveria ter dito que não. Agora não tinha alguém com quem falar, tinha afastado toda a gente: alguns porque ele não gostava, outros porque tinha vergonha. Não percebia por que é que só se conseguia lembrar de tudo isto quando estava sozinha. O telemóvel tocou: pelo menos tinha-o. E ele amava-a, certo?


Andreia Carvalho &

Filomena Bessa

Projeto Identidade - Ação pela Identidade e Igualdade

2016


Esta história volta atrás no tempo, a 1983 para ser exata. Estávamos em plena noite de Natal, o primeiro sem os meus pais, que tinham emigrado há bem pouco tempo. Trabalhei até tarde, no café da aldeia, e quando regressei a casa tinha ainda tudo por fazer. Coloquei o bacalhau e o polvo na panela, e comia distraidamente um pedaço de aletria feito na véspera quando ele chegou. "Ainda não puseste as batatas no lume?" - disse-me - "por este andar jantamos à meia noite".

Não respondi, como sempre. Não foi necessário muito tempo para aprender o truque. Comer e calar, como se costuma dizer, era a opção mais inteligente. Não interessava se tinha acabado de chegar a casa, depois de um dia exaustivo de trabalho. Não interessava se tive de amamentar a nossa filha, lavá-la e mudá-la antes de chegar à cozinha. Não queria enfurecê-lo e, por isso, resignei-me à minha insignificância.

Nunca fomos verdadeiramente felizes… quanto mais apaixonados! Eu, pelo menos, não. Casei por obrigação, imposta por mim mesma é certo, e começava a sentir na pele o peso da minha decisão. Quis perder-me nos meus pensamentos, por entre tachos e panelas, para me distrair do ar pesado que a sua presença causava.

O jantar estava pronto, e por fim pude sentar-me e descansar as pernas que começavam a acusar as demasiadas horas em pé. "Falta servi-lo", pensei eu. Ainda bem que me lembrei a tempo.

Comemos em silêncio, interrompido apenas pela voz da minha filha que começava a balbuciar as suas primeiras palavras. Olhei para ela e pensei como fora possível tão pouco amor criar algo tão perfeito. Talvez seja verdade... há males que vêm por bem.

Terminava o meu chá quando ele se levantou e disse "Vou ter com os meus amigos, vamos celebrar o Natal. Talvez passemos por cá ao final da noite para tomar um copo", e saiu porta fora. Respirei fundo, e dei graças por ter ficado por tão pouco tempo. Finalmente, pude estar à vontade.

Adormeci cedo, vencida pelo cansaço e antecipação de quem tinha de acordar bem cedo para trabalhar. Eram... talvez cinco da manhã quando ele regressou a casa mas não vinha sozinho. Ouvi as vozes de outros homens, mais de dez seguramente, acompanhados pelo bater sincronizado de bombos e caixas, como mandava a tradição da aldeia. Imediatamente, senti a minha filha a acordar e não demorou muito até desatar no choro infernal de quem queria dormir e não conseguia. Dei por mim a chorar tão desalmadamente quanto ela. Chorei de frio, de solidão, de cansaço e tristeza. Chorei até não poder mais.

Estive acordada durante mais algum tempo, rezando para que não se demorassem a sair de casa. Porém, demoraram. Gritei "Calem-se por favor, amanhã há quem trabalhe!", e arrependi-me imediatamente após tê-lo dito. Fechei os olhos e fingi estar a dormir, na esperança que ninguém me tivesse ouvido, mas os passado pesados que ouvi em direção ao meu quarto provaram o contrário.

"Que disseste sua estúpida?! Queres envergonhar-me à frente dos meus amigos?". Antes que pude sequer responder senti o seu punho a afundar-se na minha face. Tentei recompor-me quando o segundo soco me atingiu, agora em cheio no nariz. Senti o sangue a escorrer e fechei os olhos, pedindo repetidamente a Deus que não deixasse a minha menina me ver naquele estado. Perdi a conta aos murros, pontapés, estaladas e apertões que levei naquela noite de Natal. Parou quando se cansou, e saiu porta fora sem sequer me dirigir a palavra.

No dia seguinte ninguém trabalhou. 

Katarina da Silva

Aluna do Mestrado em Serviço Social

2017

© 2020 LUTO [EU]. Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Webnode Cookies
Crie o seu site grátis! Este site foi criado com a Webnode. Crie o seu gratuitamente agora! Comece agora